Livro Cine Subaé reúne críticas e análises do compositor baiano sobre produção musical, arte visual e cinema, entre 1960 e 2023.
Se não fosse músico, é bem possível que Caetano Veloso tivesse se tornado um cinema. Desde sua juventude, o cinema o encantava. Aos 19, 20 anos, ele já comentava sobre os filmes vistos no Cine Teatro Subaé, em Santo Amaro, sua terra natal. Não é exagero dizer que toda a sua obra musical é, de certa maneira, influenciada pela sétima arte.
O cinema é uma forma de arte poderosa, capaz de inspirar até mesmo os músicos mais renomados. Caetano Veloso é um exemplo de como a influência da sétima arte pode permear diferentes aspectos da criatividade de um artista. Sua ligação com os filmes e a possibilidade de ter se tornado um cineasta mostram como a paixão pelo cinema pode moldar destinos de maneiras inesperadas.
Cinema e sua influência na arte de Caetano
Mas foi necessário o livro Cine Subaé: Escritos sobre cinema (1960-2023) para revelar o quão estreita é a relação de Caetano com a sétima arte. Lançada pela Companhia das Letras e organizada por Cláudio Leal e Rodrigo Sombra, a obra reúne os escritos do cantor e compositor sobre os filmes e diretores que marcaram e influenciaram sua formação como cineasta.
Como cinéfilo, Caetano se formou nas sessões do Subaé – nome em homenagem ao rio que corta Santo Amaro. Mesmo com a poesia e a música como temas centrais de sua produção artística e intelectual, ao longo da vida, os filmes tiveram papel decisivo em seu estilo de compor canções e conceber visualmente seus shows, defendem Leal e Sombra. Caetano chegou a pensar em ser crítico de cinema.
Os textos da década de 1960 foram originalmente publicados em periódicos como o Archote, de Santo Amaro, e jornais e revistas de Salvador. O músico classifica esses escritos como ‘tateantes’.
‘Mas meu entusiasmo pelo cinema me exigia correr o risco do ridículo e escrever críticas que tivessem ao menos um arremedo de desenvolvimento intelectual’, escreve o compositor, na deliciosa apresentação de Cine Subaé. A maior parte dos textos daquela época é inédita em livro – 46 dos 64 artigos nunca saíram em coletâneas anteriores do músico.
Em suas entrevistas, o compositor endossou a visão consensual de que o exercício da crítica de cinema ficou cristalizado em seu passado. Com efeito, depois de sua atuação concentrada entre os 18 e os 21 anos, em Salvador, ele não voltou a se reconhecer nem a ser visto como um exegeta de filmes, escrevem os organizadores do livro.
Seu gesto de reencontro veio por outros caminhos. Caetano criou trilhas musicais, atuou e ‘viveu a si próprio’ em obras de Cacá Diegues e dos espanhóis Carlos Saura e Pedro Almodóvar. Em 1986, Caetano realizou o antigo sonho de fazer seu próprio longa, o filme-ensaio O cinema falado.
Esta antologia contesta a convicção do próprio autor de que houve um abandono da crítica em sua trajetória, defendem os organizadores. ‘Se observarmos a tradição, Caetano assumiu uma posição singular na história da música brasileira e do próprio cinema depois do tropicalismo, por influenciar diretamente o desenvolvimento de ideias e linguagens de cineastas’.
Cine Subaé traz ainda 12 entrevistas, depoimentos e 76 fragmentos de opiniões sobre filmes e cineastas, um material que revela predileções, as reflexões e o vasto repertório cinematográfico do compositor. É possível perceber, por exemplo, o impacto que o cinema novo teve no músico e no tropicalismo.
Mas também das grandes produções americanas, do neorrealismo italiano e da nouvelle vague francesa. Caetano testemunhou todos esses movimentos — o jovem candidato a compositor simplesmente viveu o momento mais transformador do cinema. Com 440 páginas, o livro custa R$ 129,90 (Foto: Companhia das Letras) ‘Eu queria ir todas as noites ao cinema.O som de gongo que precedia o apagar das luzes era sagrado’, escreve Caetano.
Fonte: @ NEO FEED