O grupo formado apresentará ao presidente do Senado proposta de alteração de artigos do código em votação. Inovações em tratamento de questões como fake news e aborto em relação à família.
A votação das propostas de atualização do Código Civil finalizada nesta sexta-feira representa um marco importante para o direito civil no Brasil. A revisão do texto, fruto de oitos meses de intenso trabalho, reflete o comprometimento da comissão de juristas em aprimorar a legislação vigente.
O anteprojeto de alteração de mais de mil artigos no Código Civil demonstra a necessidade constante de atualização e modernização das leis brasileiras. A contribuição dos 38 juristas envolvidos nesse processo resultará em mudanças significativas para a sociedade e para as relações interpessoais no país.
Discussão sobre o anteprojeto de Código Civil
O anteprojeto de Código Civil, que será entregue nos próximos dias ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, traz inovações como a inclusão de uma parte específica sobre Direito Digital e a ampliação do conceito de família. A proposta ainda passará por discussão dos senadores.
O Código Civil regula a vida do cidadão desde antes do nascimento e tem efeitos até depois da morte do indivíduo, passando pelo casamento, regulação de empresas e contratos, além de regras de sucessão e herança. É uma espécie de ‘Constituição do cidadão comum’.
Fake news e debate falso sobre o anteprojeto
No primeiro dia de debates, os juristas rebateram algumas informações falsas sobre o trabalho do colegiado que circulam nas redes sociais. Em entrevista aos veículos de comunicação do Senado, o presidente da comissão, ministro Luis Felipe Salomão, do STJ, repudiou os ataques. ‘O Código Civil não trata de aborto, nem tampouco da relação entre humano e animal. São notícias estapafúrdias.
Imaginamos que isso seja fruto desse fenômeno moderno das notícias falsas que inclusive está sendo tratado pelo texto. Estamos tratando de coibir essas noticias falsas por intermédio de plataformas digitais.’ Outro membro da comissão já havia se manifestado sobre o assunto nesta semana. Um dos relatores, junto com Rosa Maria de Andrade Nery, Flávio Tartuce afirmou que a verdade vai prevalecer.
Inovações propostas no anteprojeto de Código Civil
‘Eu queria esclarecer que até aqui nós não temos nenhum tratamento sobre aborto no projeto, nós não temos nenhum tratamento com família multiespécie no projeto, nós não temos nenhum tratamento sobre incesto no projeto, nós não temos nenhum tratamento a respeito de famílias paralelas.
Não há nada no código a respeito desses assuntos, e isso vai ser percebido pela própria votação.’ Como apontou Salomão, enfrentar as fake news é um dos pontos da parte sobre Direito Digital que pretende adequar o Código Civil ao entendimento dos tribunais.
O texto trata de assuntos como o direito digital à intimidade, liberdade de expressão, patrimônio e herança digital, proteção à criança, inteligência artificial, contratos e assinaturas digitais.
Importância da herança digital no anteprojeto de Código Civil
Com relação a herança digital, a ideia, segundo os juristas, é que os bens digitais de uma pessoa falecida, tais como senhas, dados financeiros, perfis em redes sociais e programas de recompensa, como milhas de companhias aéreas, façam parte da herança. ‘A nossa grande inovação é a criação de normas gerais, criando um livro próprio sobre Direito Digital.
Estamos propondo questões como a moderação de conteúdo das plataformas, avanços no neurodireito digital. São vários temas que estão sendo tratados e que vão conversar com outros pontos. Um exemplo é a herança digital e os bens digitais: moedas eletrônicas, mas também patrimônio que está em redes sociais, fotografias, os dados colocados nas redes, perfis’, disse o presidente do colegiado.
Regulamentação da inteligência artificial no anteprojeto
Outro ponto é a regulamentação da inteligência artificial. No ano passado, gerou polêmica o uso de imagens da cantora Elis Regina, morta em 1982 e que foi ‘revivida’ por meio de recursos de IA em uma propaganda de automóveis.
Segundo Salomão, a proposta do anteprojeto traz linhas gerais sobre a necessidade de autorização do uso da imagem gerada por IA e outros temas para não ficar defasado em relação a inovações tecnológicas. ‘A ideia é fazer uma regulamentação geral, sem amarrar. Ninguém vai segurar a evolução das tecnologias’, apontou.
Desdobramentos do Direito Digital de Família no anteprojeto
Um dos temas que gerou mais divergências entre os juristas foi o Direito Digital de Família. A comissão se debruçou sobre emendas e destaques ao texto dos relatores na quinta-feira, 4, e nesta sexta. Foi aprovada a ampliação do conceito de família para incluir vínculos não conjugais, que agora passam a se chamar parentais.
A proposta visa a garantir a esses grupos familiares direitos e deveres, e busca reconhecer o parentesco da socioafetividade, quando a relação é baseada no afeto e não no vínculo sanguíneo. ‘Aqui a norma trata de família anaparental (aquela na qual o grupo familiar não possui pais, mas apenas parentes colaterais), sobretudo família formada entre irmãos, primos que resolvem residir juntos.
A família monoparental (famílias formadas por mães ou pais solo) também está incluída’, disse Tartuce. O anteprojeto também legitima a união homoafetiva, reconhecida em 2011 pelo STF.
Aspectos legais do divórcio unilateral proposto no anteprojeto
A proposta prevê uma nova modalidade de divórcio ou dissolução de união estável, que poderá ser solicitada de forma unilateral. Ou seja, mesmo sem consenso, uma só pessoa do casal poderá requerer a separação, sem a necessidade de uma ação judicial.
Atualmente, existem três tipos de divórcio: judicial, quando há divergência; consensual; e extrajudicial, que pode ser feito em cartórios com consenso do casal e condições específicas. Pelo texto proposto, para solicitar o divórcio unilateral, bastaria a pessoa ir ao cartório no qual foi registrada a união do casal. Após o pedido, uma notificação será feita ao outro cônjuge ou convivente.
Mudanças propostas para desburocratizar no anteprojeto
Ao longo da semana, os juristas também discutiram e aprovaram emendas ao relatório em relação a temas como sucessão, usucapião, herança, guarda e regras para desburocratizar a abertura de empresas. ‘Procuramos avançar na tecnologia e na empresarialidade, nos mecanismos de produção e de modernidade da circulação de riquezas.
Por isso, não podemos nos retrair nos avanços da expressão humana do código’, disse a relatora Rosa Maria Nery. No primeiro dia de votação, o colegiado aprovou, em um único bloco, cerca de 600 dispositivos do relatório que não receberam destaque ou emendas. Outros 500 pontos foram debatidos e votados a partir de terça-feira, 2.
Participação e contribuições da sociedade no anteprojeto de Código Civil
A comissão de juristas foi criada pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, em agosto de 2023. Desde então, o grupo realizou encontros, audiências públicas e discussões sobre as mudanças no Código Civil. O colegiado também recebeu 280 sugestões da sociedade. Foi a primeira vez que juristas mulheres participaram da elaboração do código. Informações: Agência Senado.
Fonte: © Migalhas