GE acompanhou jogo triste que confirmou rebaixamento do time que foi sensação nos anos 2000, vice-campeão brasileiro e da Libertadores – Sertãozinho, Anacleto Campanella, recuperação judicial, campeonatos de base, novo escudo.
No último segundo da partida, o juiz encerrou o jogo e decretou a queda do São Caetano diante do Sertãozinho, levando o time a disputar a quarta divisão do Campeonato Paulista.
O Azulão, como é carinhosamente conhecido, terá que buscar sua reabilitação na próxima temporada, com muita determinação e garra para conquistar a ascensão tão almejada.
São Caetano: Em busca da recuperação
Nas arquibancadas em ruínas do quase irrenconhecível estádio Anacleto Campanella, 145 testemunhas enfrentaram uma tarde de sábado fria e chuvosa para acompanhar o time no mesmo palco que presenciou momentos de glória em um passado não tão distante. O São Caetano encerrou a Série A3 do Campeonato Paulista na vice-lanterna, com apenas dez pontos conquistados em 15 rodadas.
Foram duas vitórias, quatro empates e nove derrotas. O aproveitamento foi de apenas 22% dos pontos disputados. A média de público foi de apenas 400 pessoas. Há quase três décadas fielmente presente nos jogos do São Caetano em casa, Agostinho Folco no auge dos seus quase 90 anos desabafou sobre a situação atual do clube, algo que nunca imaginou vivenciar.
– Em todos os jogos eu compareço para ver o time jogar, mas ultimamente estou tirando o chapéu para não aparecer mais aqui para ver a estrutura, incompetência desse time que não tem condição de continuar disputando futebol na cidade. Do jeito que está a gente não pode continuar. Ou é a direção, jogadores, mas alguma coisa está errada nesse time.
– Estamos passando por uma fase que, infelizmente, não tem como continuar dessa maneira. O time perder a cidade vai ser difícil. Culpo o Nairo por todos os 30 anos de trabalho, o que ele fez com o clube não deveria ter feito. Acabou com o clube vendendo para uma pessoa que não tem responsabilidade, não é do futebol – disse um dos torcedores mais conhecidos do Azulão.
Prestes a completar 35 anos de fundação, o São Caetano deixou para trás o título paulista conquistado em 2004, os dois vices do Brasileirão (2000 e 2001) e o vice da Conmebol Libertadores (2002), acumulando incertezas e dívidas que ultrapassam os R$ 70 milhões. Em recuperação judicial, o Azulão terá de recomeçar praticamente do zero.
Em 2025, o São Caetano irá disputar a penúltima divisão do futebol profissional de São Paulo. Sem calendário nacional e cada vez mais distante do protagonismo que viveu no passado, o futuro passa a ser uma incógnita. – Todo início é complicado, a dívida do São Caetano é grande, está sanada 30%, 40% disso e estamos na recuperação judicial, que também está sendo cuidada.
Nós temos a tranqulidade de dizer que em quatro meses, no máximo, estaremos com as contas abertas no São Caetano e regularizados nas questões trabalhistas, fiscais e todo tipo de problema que foi gerado em anos. – Não vai ser em quatro meses que sou presidente e dono que isso resolveria.
São Caetano: Ascensão meteórica
Fundado em 1989, o São Caetano levou pouco tempo para figurar entre os principais clubes do futebol brasileiro. O caminho foi sólido. Em 1993, o São Caetano já figurava na elite estadual. Vice-campeão da Série C em 1998, no ano seguinte disputou a Série B do Brasileiro.
Em 2000, no Módulo Amarelo da extinta Copa João Havelange, foi finalista e ficou com o vice, sendo derrotado pelo Vasco em decisão polêmica após a queda do alambrado em São Januário e o término da competição apenas em 2001, em um jogo no Maracanã. Na elite do Campeonato Brasileiro, o Azulão foi finalista novamente em 2001, sendo derrotado pelo Athletico na decisão.
A boa campanha rendeu uma vaga na Libertadores da América. Em 2002, o São Caetano chegou à final com um time forte comandado pelo técnico Jair Picerni e eliminou os tradicionais Universidad Católica, Peñarol e América do México até a final contra o Olimpia.
O título escapou por pouco: depois de vencer por 1 a 0 o jogo de ida, no Paraguai, o São Caetano saiu na frente no Pacaembu, com gol de Ailton, mas viu o Olimpia se impor e virar para 2 a 1, levando a decisão aos pênaltis e confirmando a conquista. O título paulista de 2004 coroou e encerrou cinco anos de ouro vividos pelo time do ABC paulista.
Depois daquilo, o Azulão colecionou resultados ruins – mais frequentes do que as conquistas (Copa Paulista de 2019 e Série A2 do Paulista de 2020), que parecem ter sido pequenos lampejos de uma ressuscitação jamais confirmada. Desde que decidiu o título da Libertadores de 2002, o São Caetano foi rebaixado oito vezes.
São Caetano: De mecenas em mecenas
O São Caetano recebia doações da família Klein, fundadora da rede de lojas Casas Bahia.
O nome mais influente no clube era Saul Klein, que deixou o dia a dia do Azulão em 2020, após desentendimento com Nairo Ferreira, presidente por mais de duas décadas – e que se afastou do futebol no ano passado. Segundo Klein, foram doados pela família mais de R$ 80 milhões. No mesmo período, segundo ele, o São Caetano teria acumulado dívidas acima dos R$ 50 milhões.
A troca de farpas entre investidor e cartola acabou encerrando a relação entre a família e o clube. O desfecho do fim da parceria entre família Klein e São Caetano não foi positivo, principalmente para o clube. O auge da crise aconteceu em 2020, quando o Azulão acumulou mais de seis meses sem pagar salários para jogadores, fornecedores e funcionários.
Os atrasos fizeram o clube pagar dentro de campo. Revoltados com a situação, jogadores do São Caetano se recusaram a entrar em campo em jogo da Série D do Brasileiro, quando o Marcílio Dias venceu por W.O. Antes da greve dos atletas, houve ainda uma derrota em casa para o Pelotas por 9 a 0.
O resultado foi a eliminação precoce do São Caetano ainda na primeira fase da Série D de 2020, marcando a última participação do clube em uma divisão de Campeonato Brasileiro. O São Caetano chegou a ir a leilão por duas vezes, com lance inicial que baixou de R$ 90 milhões para R$ 60 milhões.
Sem interessados, o antigo dono do Azulão conseguiu vitória na Justiça que o fez desistir da ideia.
Após ser vendido ao empresário Manoel Sabino Neto, que chegou a ser preso enquanto presidia o clube por suposto envolvimento em crime de lavagem de dinheiro, o São Caetano agora pertence ao empresário Jorge Machado, conhecido no meio do futebol por agenciar a carreira de Felipão e jogadores de sucesso, como Rivaldo.
São Caetano: Mudança de escudo e futuro
O novo dono ensaiou uma mudança radical no São Caetano, propondo uma troca de escudo e identidade visual, mas voltou atrás após repercussão negativa entre os torcedores. Jorge Machado admite o erro, mas cita que isso o fez acreditar na força que o Azulão ainda tem na cidade.
– Quando tentei viabilizar a troca do brasão do clube, algo que está totalmente descartado, foi um erro, vimos milhões e milhões de pessoas nas redes sociais. O torcedor do São Caetano existe, só está escondido. Quando o São Caetano voltar a vencer, eles irão voltar e conto com eles sempre.
Jorge Machado diz ter tirado do próprio bolso entre R$ 15 e R$ 20 milhões para ‘manter o São Caetano de portas abertas’. A ideia do empresário é conseguir sanar as dívidas do clube aos poucos para ter fôlego para novos investimentos na captação e revelação de jogadores por meio das categorias de base.
– Vamos disputar a Copa Paulista, os campeonatos de categoria de base e temos tempo para olhar mais isso. É uma região de muito talento, onde se peneira grandes jogadores e eu mesmo como empresário levei Mário Fernandes, Matheus Henrique, Gabriel Silva e jogadores de sucesso da região do São Caetano.
Vou fazer peneiras em todas as regiões, vamos fazer o São Caetano de novo um representante de revelação de craques. O novo dono do São Caetano acredita que pode recolocar o clube na elite estadual em um prazo de até cinco anos. – As maiores SAFs do mundo começaram assim.
A Red Bull comprou o Leipzig na quinta divisão e hoje é um clube que disputa a Champions League e a primeira divisão do Campeonato Alemão. Vários clubes que trabalhei vieram da quinta, terceira [divisões]. Claro que é possível, o São Caetano tem uma camisa forte, nome forte, uma cidade forte e está no vulcão do business que é São Paulo, claro que é possível.
O Azulão ainda deve tentar uma última cartada pensando na manutenção na Série A3 em 2025. O clube pediu investigação para a Federação Paulista de Futebol sobre as suspeitas de manipulação de resultados envolvendo a Matonense, que ficou na lanterna e foi a outra equipe rebaixada para a quarta divisão estadual.
O clube de Matão teve os seus últimos quatro jogos no estadual suspensos, com os adversários sendo declarados vencedores pelo placar de 3 a 0. O TJD-SP suspenseu clube e atletas com base no Artigo 35 do Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD).
Fonte: © GE – Globo Esportes